quarta-feira, agosto 18, 2010

GUILHERME FIUZA: O JEITO PETISTA DE PRIVATIZAR O ESTADO

Deixei passar este ilustrativo artigo do colunista, publicado na revista Época de 2 de agosto p.p.. Recupero-o a tempo para que mais gente possa ter a chance de entender o que se passa, sem maiores dificuldades. A ironia fina de Fiuza às vezes tira um pouco da gravidade de suas palavras, sua elegência no entanto não empana o brilho dos seus argumentos. Muito apropriado no momento atual de mascaramento diuturno da realidadepelo Governo.
 

O JEITO PETISTA DE PRIVATIZAR O ESTADO

por Guilherme Fiuza, na revista Época, em 2/8/10

Uma das marcas inquestionáveis que o governo Lula deixará na história deste país é a destruição da credibilidade dos Correios. Verdadeira façanha, considerando a fé cega que os brasileiros tinham nessa instituição – até outro dia, um símbolo sólido de integração nacional. Hoje, correio é plano B para e-mail e motoboy. Uma revolução.

E eis que Lula, já de saída, demite o presidente dos Correios. Os desavisados, traumatizados com as célebres imagens da propina embolsada ao vivo na estatal – prenúncio da revolução –, festejaram: enfim a moralização. Mas não era bem isso. O presidente demitido, um técnico, deu lugar a um afilhado político. A revolução continua.

Com sua peculiar gestão do Estado brasileiro, Lula, o PT e seus amigos inauguraram o nacionalismo privado. Como diz o slogan oficial, o Brasil passou a ser “um país de todos” – de todos os companheiros. Ou quase todos, porque a gula é grande.

E o que fazer com as cartas que atrasam e as encomendas que não chegam a seu destino? Nada. Basta pregar na parede uma dessas pesquisas que mostram quase 80% da população assinando o cheque em branco para o grande chefe. E tocar em frente a partilha particular da coisa pública. O povo, esse altruísta, está adorando.

É um Brasil mais transparente, onde a correspondência postal é um livro aberto, e o sigilo fiscal é do companheiro que lançar mão. Num governo que devassa o Imposto de Renda de um cidadão para catar munição política, querer que uma carta seja respeitada pelo correio é quase um capricho pequeno-burguês.

A Receita Federal e os Correios, outrora instituições públicas inexpugnáveis, hoje são outdoors do originalíssimo modelo de privatização do PT. A Petrobras, orgulho nacional, vai pelo mesmo caminho. O petróleo é nosso (deles). Com uma gestão financeira que ninguém entende, desafiando a inteligência dos maiores especialistas, a estatal que chegou ao tesouro do pré-sal anda de pires na mão.

Com sua peculiar gestão do Estado brasileiro, Lula, o PT e seus amigos inauguraram o nacionalismo privado

Pela segunda vez em pouco mais de dois anos, a Petrobras abocanhou um empréstimo bilionário da Caixa Econômica Federal. A pendura já passa de R$ 5 bilhões, mais de três vezes o orçamento nacional para o saneamento básico, que provém da mesma Caixa. Curiosamente, era o orçamento da Petrobras que aparecia engordando a verba cabalística de R$ 500 bilhões do Programa de Aceleração do Crescimento – cujas ações de infraestrutura deveriam promover, entre outras, obras de saneamento básico. É o governo tentando fazer a locomotiva do PAC pegar no tranco.

Ainda não se sabe bem aonde vai dar esse milagre da multiplicação estatal de cargos e verbas. A usina hidrelétrica de Belo Monte, megaempreendimento leiloado a toque de caixa para caber no mandato de Lula, terá a mesma varinha de condão. Na carência de investimento privado, o governo afogará no futuro lago amazônico o dinheiro que não tem. O grande “capitalista” da obra será o BNDES, à custa da fabricação de dívida pública. O velho almoço grátis, que o contribuinte já deveria ter entendido quem é que paga no final.

E o que dizer das verbas da reforma agrária que escorrem ilegalmente do Incra para uma ONG fundada, entre outros, pelo companheiro Delúbio? Nada. Diante dos poderosos dutos partidários fincados nos cofres do Estado brasileiro, esse caso é apenas – como diria o próprio Delúbio – uma unha encravada.

Correios, Receita Federal, Petrobras, Caixa Econômica, BNDES. O que será dito sobre as joias da coroa nesta reta final de campanha presidencial? Que ninguém se iluda. A candidata de Lula aparecerá como guardiã do patrimônio estatal, contra a sanha privatista do inimigo neoliberal. No imaginário coletivo, a esquerda tem o monopólio do carinho com o que é “nosso”.

A privatização petista do Estado é o crime perfeito.

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