Desde as primeiras notícias sobre o assassinato (foi isso o que foi) de Celso Daniel, e não sei bem porque, fiquei com um elefante atrás da orelha e os dois pés atrás do outro, com a figura do "empresário-amigo", que dirigia o carro e a quem nada aconteceu. Não me cheirou bem, a despeito de não ter contra esse indivíduo, nada mais do que uma prevenção etérea.
Mas o célebre Cesare Lombroso fez estudos importantes e acho que eu captei alguma coisa naqueles olhos de cachorro molhado do tal do Sérgio. Duas semanas depois, um articulista no JB, Cid Benjamin, publica o sóbrio e competente levantamento que transcrevo abaixo, que se não é conclusivo, me faz ficar cada vez mais desconfiado daquela figura.
Queiram apreciar suas colocações e me digam depois alguma coisa. Segue aí ó:
A trajetória sombria de Sérgio Chefe
Um mês antes de ser morto, Celso Daniel desarticulou esquema suspeito de corrupção na prefeitura de Santo André
por CID BENJAMIN - JB, 30/01/02
SÃO PAULO E SANTO ANDRÉ - Depois de participar da campanha que leva Celso Daniel pela primeira vez à prefeitura de Santo André, em 1988, Sérgio Gomes da Silva, o Sérgio Chefe é nomeado presidente da Defesa Civil do município. Organiza também a equipe de segurança pessoal do prefeito, com praticantes de artes marciais e ex-policiais. Eles devotam fidelidade quase canina ao mentor. Na campanha seguinte de Celso, para deputado federal, em 1994 Sérgio ocupa posto estratégico. É o tesoureiro, uma tarefa vital em campanhas do PT, quase sempre carentes de recursos. Aproxima-se ainda mais de Celso. Da época vem também o estreitamento de suas relações com empresários da construção civil e de transporte em Santo André. Em 1996, Celso se elege pela segunda vez prefeito. Recebe 52% dos votos e ganha no primeiro turno. De novo, Sérgio é figura-chave, sempre como tesoureiro. É aceito dinheiro de empreiteiras e de empresários de transporte que mantinham negócios com a prefeitura. Não faltam recursos. Empossado o prefeito, para surpresa de muitos Sérgio Chefe prefere ficar fora da administração. Começa a trabalhar com Ronan Maria Pinto, dono de linhas de ônibus e empresário com negócios na prefeitura. Os dois se associam em outras empresas, fora de Santo André. Mas Sérgio faz de um íntimo aliado, Klinger de Oliveira Sousa, um super-secretário, responsável pelos setores de Obras e Transportes. Mesmo sem cargo formal, o Chefe mantém forte influência na administração, admitem petistas que lá trabalham até hoje. Seu poder é tanto que incomoda militantes, e os leva a se desligar da administração. A essa altura já crescem na cidade rumores sobre supostas ligações incestuosas de Sérgio Chefe com empresários envolvidos em negócios com a prefeitura, por meio da secretaria de Klinger. As notícias chegam aos ouvidos da cúpula petista. O dirigente nacional Gilberto Carvalho, homem de confiança de Luiz Inácio Lula da Silva e José Dirceu, é designado para trabalhar na administração municipal. Gilberto é nomeado secretário de Comunicação. Um quadro experiente, afeito ao diálogo e de estilo conciliador, poderia, para Lula e Dirceu, repor o trem nos trilhos sem grandes traumas. Os rumores, contudo, não arrefecem. Em 2000 o Ministério Pública começa a investigá-los. Envolvem as áreas de influência de Sérgio Chefe. A apuração não foi ainda concluída, mas se sabe por exemplo que, entre 97 e 98, Sérgio Chefe recebe R$ 270 mil do empresário Ronan Pinto como remuneração por consultoria nas áreas de transporte e limpeza urbana. Ronan ganhara um contrato no valor de R$ 13 milhões em licitação promovida pela secretaria de Klinger. Ao vir à tona, a informação sobre a remuneração do Chefe causa espanto a alguns. Afinal, ninguém conhecia seus atributos profissionais nas áreas de transporte urbano e coleta de lixo. Outros, porém, vêem a confirmação de que o Chefe faz mesmo tráfico de influência. Em 2000, Celso Daniel é reeleito com 72% dos votos. É o reconhecimento popular da gestão que mudara a imagem da cidade. Celso era competente especialista nas questões urbanas e Santo André se transformara em sua administração - isso até os adversários admitem. De novo, a tesouraria fica a cargo de Sérgio e não faltaram recursos. Klinger, o homem de Sérgio Chefe na administração, se elege vereador com uma campanha que, de tão rica, provocou ressentimentos em outros candidatos petistas. Sem tradição política na cidade, é o mais votado para a Câmara Municipal de Santo André. apesar disso, permanece secretário. O grupo de Sérgio apóia, ainda, outro candidato: Raulino Lima, um ex-metalúrgico, ex-integrante da comissão de fábrica da Volkswagem em São Bernardo, também eleito. Celso não chega a romper com o esquema de Sérgio chefe, como queria a direção nacional, mas dá os primeiros passos ao fortalecer seus adversários no secretariado. Dá a Gilberto Carvalho uma secretaria mais importante, a de Governo, e amplia os poderes da ex-mulher, Miriam Belchior, secretária de Administração. Miriam, odiada por Sérgio, que sempre a hostilizava, passa a ser uma super-secretária, acumulando a pasta de Inclusão Social. Ganha autoridade sobre projetos de outras áreas. Ela, na linha de frente, com estilo mais combativa, e Gilberto, mais diplomático, representam no primeiro escalão o contraponto a Klinger e ao grupo de Sérgio Chefe. Em meados de 2001, Celso Daniel é convidado a participar da coordenação da campanha de Lula e dirigir o grupo encarregado de montar o programa de governo. O convite incluía uma exigência: antes de se licenciar da prefeitura para se dedicar à campanha presidencial, deveria desarticular o esquema de Sérgio Chefe na administração. Pela primeira vez, então, Celso Daniel deixa de se equilibrar entre os dois extremos e começa a se afastar de Sérgio. Os golpes no esquema de Sérgio Chefe continuam. Seu homem-chave na prefeitura, Klinger, era preparado para suceder Celso. O caminho passava pelas eleições deste ano. Garantida a fartura de recursos na campanha, Klinger se elegeria deputado estadual. Raulino Lima, o outro vereador do grupo de Sérgio, concorreria a deputado federal. Dificilmente se elegeria, mas dividiria os votos petistas da cidade, impedindo a reeleição do único deputado federal do partido com base em Santo André, o Professor Luizinho. Se tudo desse certo, Klinger seria eleito com grande votação e Luizinho não renovaria o mandato. Assim, em 2004, o preposto do Chefe apareceria como o nome natural no PT para disputar a prefeitura. Em dezembro do ano passado, porém, o prefeito comunica que não aceitaria entre os secretários candidatos a deputado. É uma tática para bloquear os planos de Sérgio e Klinger. Pelo prestígio de Celso no PT de Santo André, tal posição tornava inviável a candidatura do secretário e jogava por terra a operação 2004, tal como imaginada pelo grupo de Sérgio. O próprio Klinger não disfarça a contrariedade em declarações a jornais locais. A relação entre Celso e Sérgio Chefe se azeda. Morto Celso, os mistérios se multiplicam. Muitos deles já têm foram temas de reportagens. Outros surgem a cada momento. Ao ser encontrado assassinado, Celso trajava roupa diferente da que vestia ao ser seqüestrado, e com a qual foi filmado, em companhia de Sérgio Chefe, no restaurante Rubayat. A namorada Ivone de Santana reconhece a calça do cadáver como sendo de Celso. Ou seja: alguém ligado aos assassinos tinha consigo a calça, ou foi buscá-la no apartamento de Celso depois do seqüestro. Nos dois casos, teria que ser íntimo do prefeito executado. No dia do velório, Sérgio estava internado numa clínica, sedado. Klinger não esperou o enterro para anunciar a mudança de planos. Em declaração publicada no dia seguinte (22/1/2001) no Diário do Grande ABC , diante de uma pergunta sobre a candidatura, responde: ''Estou emocionado e preciso refletir melhor. Mas é óbvio que essa decisão (de não mais se candidatar a deputado estadual) estava em um contexto pessoal do Celso que não existe mais. Tudo isso precisa ser analisado.''
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